HISTÓRIA DO BRASIL: VASTO CAMPO DE PESQUISAS E OPORTUNIDADES

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010


Revista Historiador. Número 02. Ano 02. Dezembro de 2009

Disponível em: http://www.historialivre.com/revistahistoriador

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HISTÓRIA DO BRASIL: VASTO CAMPO DE PESQUISAS E OPORTUNIDADES

 

Em sua segunda edição, a REVISTA HISTORIADOR traz um conjunto de artigos sob

o tema "História do Brasil" que explicita a crescente demanda e interesse pela história

brasileira, seja por parte de pesquisadores e historiadores, do próprio público leitor (e

editoras), ou mesmo do público externo. A iniciativa desse grupo de jovens historiadores –

graduandos e pós-graduandos – vislumbra tal empenho pelos temas brasileiros (desde a

História colonial até o Tempo Presente), concretizado nessa publicação.

O crescente interesse pelos assuntos brasileiros pode ser entendido como reflexo do

momento político do país: as duas décadas da Nova República trazem à tona a construção

da estabilidade política brasileira (seja pela prática democrática, seja pela solidificação das

instituições), notadamente nos governos dos Presidentes Fernando Henrique Cardoso e

Luis Inácio Lula da Silva. Adicionalmente, o estudo e a pesquisa dos períodos anteriores,

complementarmente, se tornam cada vez mais vitais no processo de entendimento da

realidade brasileira do século XXI.

Um bom exemplo dessa demanda é a nova geração de historiadores (conhecidos

como brasilianistas) que tem surgido nos Estados Unidos a partir da nossa

redemocratização (principalmente nomes como Todd Diacone e Bryan McCann). Porém,

esse novo grupo de intelectuais norte-americanos interessados em entender o Brasil não se

envolve em questões macro, como fizeram seus antecessores nas décadas de 1960 e 1970,

como Thomas Skidmore e Alfred Stepan, mas em estudos de áreas bastante específicas.

Essa nova onda de interesse pelo Brasil notada em instituições de ensino também se

concretiza com a criação de Cátedras e Centros de Estudos Brasileiros, como nas

Universidades de Illinois (Estados Unidos), Leiden (Holanda), Oxford (Inglaterra) e a criação

da Fundação Cultural Hispano-Brasileira, na Universidade de Salamanca (Espanha).

Segundo estimativa da Associação de Estudos Brasileiros (BRASA), existe atualmente 15

desses centros especializados em Brasil nos EUA e na Europa, além de o país ser o foco

também em outros centros de pesquisas dedicados à América Latina.

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Por aqui, nota-se um sensível aprofundamento das pesquisas referentes aos agentes

envolvidos no desenvolvimento político-econômico (e mesmo social) do Brasil. Assim, nessa

edição – em linha cronológica – Gabriele Rodrigues de Moura (A representação em

Conquista Espiritual sobre a invasão e a destruição da Província do Tape) apresenta um

breve histórico sobre as primeiras Missões na Província do Tape (que hoje forma o atual

Estado do Rio Grande do Sul), pertencente à Província Jesuítica do Paraguai (entre os anos

de 1626 e 1638). O estudo volta-se especificamente para as representações presentes no

livro Conquista Espiritual, do jesuíta Antônio Ruiz de Montoya, escrito durante sua estada na

Corte de Madrid.

Daniel Oliveira, no trabalho intitulado "Doença ou Estigma social? Enfermos venéreos

em hospitais de Porto Alegre no final do século XIX" identifica – social e historicamente – o

perfil dos enfermos acometidos por doenças venéreas que receberam assistência médica na

Santa Casa de Misericórdia e no Hospital da Sociedade de Beneficência Portuguesa, ambos

de Porto Alegre, durante os anos de 1881 a 1892. A realização da pesquisa através de

análise quantitativa (informações transcritas de livros de entradas nas enfermarias) é rica no

sentido de contextualização e análise de como as doenças venéreas e os seus enfermos se

inseriam na sociedade porto-alegrense daquele período, considerando assim, diversos

aspectos daquela sociedade, como o pensamento social/científico da época, as

transformações sociais que se desenvolviam e o período de fim da escravatura,

industrialização inicial, aumento populacional e conseqüente urbanização e a origem dos

cortiços na cidade.

O artigo apresentado por Fábio Bastos Rufino (História, Direito e Política: Arnaldo

Süssekind e a consolidação das Leis do Trabalho no Brasil – um olhar retrospectivo)

analisa, a partir de fonte oral – entrevistas realizadas com o magistrado Arnaldo Süssekind –

, o processo de criação e constituição da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) no

Brasil, com o objetivo de identificar no sujeito histórico elementos da Cultura Política do

Estado Novo.

Em "Economia e Política: Reflexões sobre os Governos Vargas, JK e João Goulart",

de Fernanda Melchionna e Silva e Marcus Vinicius Martins Vianna discute as características

do processo de industrialização brasileiro, do segundo governo de Getulio Vargas, passando

por Juscelino Kubitscheck e chegando em João Goulart, traçando um paralelo entre as

políticas desenvolvimentistas, as forças políticas envolvidas e a atuação do movimento de

trabalhadores em cada época.

Visão essa que é complementada por Débora Specht, Maria Helena Marin e Priscila

Farias dos Santos, em "Bens Duráveis: a industrialização no Brasil no período Juscelino

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Kubitschek (1956-1960)", ao analisar a política econômica do governo Juscelino Kubitschek

– desde a implantação do Plano de Metas até seus resultados a curto prazo – ponderando

sobre a intensa industrialização do período (principalmente de bens duráveis e de

automóveis), com a entrada maciça de capital estrangeiro.

Como conseqüência direta desse processo de industrialização, a urbanização

brasileira teve um salto nas décadas de 1950 e 1960: nesse sentido, o artigo "A Vila do IAPI

no contexto de urbanização e industrialização", de Cleusa Terezinha Azambuja da Silva,

Cristina Didonet Nery Tavares da Cunha Mello e Laura Regina do Canto Leal apresenta tal

desenvolvimento urbano na cidade de Porto Alegre, tendo como foco o Conjunto

Residencial Vila do IAPI, dentro do bairro Passo d' Areia (como início do processo de

urbanização da várzea do Gravataí - parte da Zona Norte da capital gaúcha). O projeto

inovador era baseado nos moldes das cidades-jardins européias para operários, onde os

conjuntos habitacionais tinham espaços específicos para casas, jardins e áreas verdes, com

poucos traços geométricos, diferenciando-se do estilo modernista adotado em outros

projetos.

Dois artigos trazem reflexões sobre agentes diretamente envolvidos no período da

Ditadura Militar: Priscila Farias dos Santos, em "A participação dos Freis Dominicanos no

Regime Militar Brasileiro" analisa a participação de um grupo de freis da Ordem dos

Dominicanos, na oposição ao Regime Militar, salientando que a atuação política e social dos

dominicanos no Brasil não se deu apenas a partir do golpe de 1964; na verdade, muitos de

seus membros eram oriundos de grupos da Ação Católica, criados ao final da década de

1940, onde já se podia observar o início da divisão no catolicismo brasileiro. Dentro da

esquerda católica brasileira, esses frades podem ser vistos como uma dissidência, pois

foram os únicos ligados diretamente à Igreja Católica que se envolveram com um

movimento guerrilheiro. Em complemento a essa discussão, o artigo de Giovana Inácio dos

Santos, Josiel Eilers Goulart e Marcos Emílio Ekman Faber (Teologia da Libertação:

resistência intelectual nos anos de chumbo) considera o surgimento e o desenvolvimento da

Teologia da Libertação no Brasil e a forma com que esta se desenvolveu na sociedade

brasileira, através das Comunidades Eclesiásticas de Base. Segue-se uma breve discussão

acerca do surgimento da Teologia da Libertação não como simples teoria, mas como uma

teoria orientada para a prática, fazendo uma análise histórica e social da realidade em que a

comunidade está inserida, porém, sem abandonar seu caráter cristocêntrico.

Na contemporaneidade, Alexandre Prinzler Karpowicz analisa o discurso midiático a

partir de uma série de matérias do Jornal Zero Hora, denominada "O X da educação", sobre

o modo como ocorrem os processos educacionais de alfabetização no interior das escolas

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do Movimento Sem Terra, no artigo "Problematizando os discursos da mídia eletrônica

(jornal) a respeito do mito de uma educação para o conflito na pedagogia do Movimento dos

Trabalhadores Sem Terra – MST". O autor discorre sobre os discursos formadores de

opinião sobre a pedagogia das escolas do MST, a partir de Michel Foucault não como

conjunto de signos (ideias, opiniões), mas como práticas que formam sistematicamente os

objetos de que falam e o autor questiona: por que analisar a dimensão histórica de um

movimento social?

Seguindo a linha de análise a partir dos Estudos Culturais em Educação e dos

estudos também desenvolvidos por Michel Foucault, o artigo de Fabio Ricardo Bastos

Gomes (Práticas discursivas de um "estrangeiro" na educação: problematizando os

discursos de Gustavo Ioschpe veiculados na revista VEJA e no Jornal Zero Hora),

problematiza o espaço concedido aos profissionais das mais diversas áreas do

conhecimento para explicitarem suas opiniões sobre a educação no país, prescrevendo

possíveis soluções para a resolução dos problemas. Para tanto, através da análise textual,

define como foco de investigação as práticas discursivas produzidas pelo economista

Gustavo Ioschpe sobre a educação brasileira presentes em suas colunas na revista VEJA e

no jornal Zero Hora, veiculadas em sua versão eletrônica, como produtoras de regimes de

verdades pedagógicas que apontam como causa da dita crise do ensino à formação

acadêmica dos professores.

No artigo "O processo de formação das atitudes políticas dos jovens da Assembléia de

Deus em Porto Alegre/RS", André Luis dos Santos trabalha com os efeitos do dogma

religioso no processo de socialização política dos jovens da Igreja Assembléia de Deus em

Porto Alegre. Para tanto, o autor parte da premissa de que a práxis discursiva de algumas

denominações evangélicas mais ortodoxas (do ponto de vista do controle social exercido

sobre o conjunto dos adeptos), possa influir diretamente no processo de socialização política

dos jovens que freqüentam mais assiduamente os templos e atividades afins. A hipótese é

de que quanto mais elevado for o dogmatismo, maior será a probabilidade de

desenvolvimento de uma personalidade orientada para a desvalorização da política. A

própria Teologia da Prosperidade é analisada a partir do dito tom de convencimento que

introduz (necessário para transformar o fenômeno da conversão evangélica, no Brasil, nas

últimas décadas), assim como a introdução de representantes da maioria dessas

denominações na esfera política.

Por fim, numa análise profunda sobre a educação patrimonial e o uso da cultura

material dos museus no interior do Rio Grande do Sul, Carlos Augusto Trojaner de Sá

apresenta o artigo "A cultura material na cidade de Nova Petrópolis: educação patrimonial

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nos museus", com a análise de como os museus de Nova Petrópolis envolvem a sociedade

com a temática da imigração alemã, fazendo uma relação muito significativa entre a cultura

material e a educação patrimonial. O resultado disso é uma construção do conhecimento

através dos museus e a relação de como estão sendo abordados (e vinculados) os objetos

dos primeiros pioneiros alemães (cultura material) com a educação patrimonial realizada nos

museus dessa cidade.

Assim, a leitura desses artigos possibilita a percepção da importância da História do

Brasil e dimensiona o quão valorosa é a presente iniciativa no sentido de incentivar os

graduandos e pós-graduandos às pesquisas e publicações, não somente como forma de

qualificar sua inserção no mercado de trabalho, mas também como possibilidade de

aprofundamento das mesmas, em níveis de strictu sensu (Programas de Mestrado e

Doutorado).´

 

Kamilla R. Rizzi

Licenciada em História e Mestre em Relações Internacionais/UFRGS e Doutoranda em Ciência Política no

IFCH/UFRGS. Professora convidada do curso de Especialização Lato Sensu

em História do Brasil Contemporâneo da FAPA e Professora licenciada de Relações Internacionais da FAACS.