Mindlin, um mecenas que não fazia nada sem alegria

domingo, 28 de fevereiro de 2010


Mindlin, um mecenas que não fazia nada sem alegria
Seu sacrifício pessoal rendeu ótimos títulos publicados com a ajuda de sua
biblioteca, entre eles os volumes da História da Vida Privada no Brasil.
Antonio Gonçalves Filho, de O Estado de S. Paulo

Divulgação/Márcio Scavone
José Mindlin (1914-2010)

SÃO PAULO - O ex-libris de José Mindlin, selo pessoal que o bibliófilo
colocou em sua coleção de livros raros, não poderia identificar melhor quem
foi o empresário, intelectual e acadêmico morto neste domingo, 28, em São
Paulo, aos 95 anos, após prolongada doença: "Je ne fait rien sans gayeté"
(Não faço nada sem alegria). De fato, quem teve o privilégio de conhecer e
conviver com Mindlin, sabe que caiu bem na vida do maior colecionador de
livros do Brasil a escolha dessa máxima de Montaigne, retirada de seus
Ensaios (do qual sua biblioteca tem um raríssimo exemplar, de 1588, que
pertenceu ao crítico Saint-Beuve). Talvez a única coisa que fez sem alegria
foi deixar este mundo sem ver concluído o prédio da Brasiliana USP, projeto
acadêmico da Universidade de São Paulo que reúne a maior coleção de livros e
documentos sobre o Brasil, um moderno edifício de 20 mil metros quadrados na
Cidade Universitária sob a responsabilidade da Biblioteca Brasiliana Guita e
José Mindlin, órgão da Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária da
USP.
Sonho maior do bibliófilo, a coleção Brasiliana, composta por 17 mil títulos
(ou 40 mil volumes) de literatura e manuscritos históricos doados pelo
colecionador, é o maior legado deixado por Mindlin além da herança ética que
o Brasil recebe desse empresário, jornalista, ex-secretário de Cultura de
São Paulo e membro das academias Brasileira e Paulista de Letras. Desde
adolescente avesso ao autoritarismo, Mindlin começou sua carreira
jornalística aos 15 anos como redator do Estado, driblando a censura durante
a Revolução de 1930. Da sala de Julio de Mesquita, então diretor do jornal,
ele transmitia instruções para a sucursal do Rio - em inglês, para confundir
a escuta telefônica. Outro exemplo de sua conduta ética foi o pedido de
demissão do cargo de secretário de Cultura do governo Paulo Egydio quando o
jornalista Vladimir Herzog foi morto pela ditadura militar, em outubro de
1975.
Posteriormente, ao ser convidado pelo governo civil de Fernando Collor para
ocupar o cargo de ministro da Fazenda, Mindlin, traumatizado com cargos
públicos, declinou da oferta, ocupando-se de sua biblioteca de 40 mil
títulos, que manteve por mais de sete décadas com a ajuda de sua mulher
Guita e, após a morte desta, em 2006, por mais quatro anos até ficar doente.
Instalada em sua casa no Brooklin, na qual morou por mais de 60 anos, a
biblioteca era o grande orgulho de Mindlin. Nela repousam raridades como a
primeira edição de Os Lusíadas, de 1572, um original do padre Antonio
Vieira, os originais de Sagarana, de Guimarães Rosa, corrigidos à mão pelo
autor, além do primeiro livro que Mindlin comprou num sebo quando tinha 13
anos, Discurso sobre a História Universal, escrito em 1740 pelo bispo
francês Jacob Bossuet. Oito décadas depois, outros 40 mil livros juntaram-se
ao exemplar raro de Bossuet, muitos deles já disponíveis para consulta
pública na Brasiliana Digital, a biblioteca virtual desenvolvida com o
acervo físico doado pelo empresário à USP em 2006.
Mindlin não colecionava livros raros por fetiche. Queria dividir o prazer da
leitura com milhares de pessoas. Mesmo como empresário, que transformou a
Metal Leve de uma pequena fábrica de pistões, nos anos 1950, numa empresa
gigantesca do setor de autopeças, Mindlin buscou o ideal de uma gestão
democrática em que os operários pudessem ter voz ativa nas discussões sobre
seu destino. Com a globalização, a Metal Leve não sobreviveu ao assédio do
capital estrangeiro e, em 1996, foi comprada por sua maior concorrente, a
alemã Mahle. O empresário, então com 82 anos, mais da metade dedicados à
Metal Leve, não se aposentou, participando dos conselhos de administração de
grupos - O Estado de S. Paulo, entre eles - ou de instituições como a
Sociedade de Cultura Artística, da qual seu pai foi um dos fundadores.
Filho de um dentista judeu de origem russa, apaixonado por música e pintura,
Mindlin herdou a paixão pela cultura do pai, que costumava receber em casa
escritores como Mário de Andrade. Esse contato próximo com grandes
estudiosos dos problemas brasileiros o transformou em farejador de raridades
ao topar, ainda adolescente, em Paris, com o clássico História do Brasil, a
narrativa de frei Vicente de Salvador, de 1627, que o fez se interessar pelo
passado do País. Desde então, obcecado pela ideia de construir a maior
biblioteca dedicada a estudos brasileiros, aproveitava todo tempo livre em
sua viagens internacionais para garimpar títulos que nem a Biblioteca
Nacional do Rio de Janeiro sonhou em ter no acervo. Seu sacrifício pessoal
rendeu ótimos títulos publicados com a ajuda de sua biblioteca, entre eles
os volumes da História da Vida Privada no Brasil, cujo conteúdo foi
pesquisado na casa do Brooklin, frequentada pelos maiores intelectuais do
País.
Mecenas, Mindlin, um dos articuladores da Fundação Vitae, que concedia
bolsas para a realização de projetos culturais, ele publicou livros de
grandes amigos poetas, como Carlos Drummond de Andrade, e artistas visuais
como a gravadora Renina Katz. Seu acervo de obras em papel tem peças raras
de artistas como Goeldi, Lescoschek, Lívio Abramo e Iberê Camargo. Mindlin
costumava dizer que essa escolha se devia mais à mulher Guita, com quem teve
70 anos de vida em comum. Seu negócio mesmo era a leitura, hábito que,
infelizmente, foi obrigado a abandonar nos últimos anos por problemas de
saúde. Antes que seus olhos enfraquecessem, ele leu, porém, mais de cinco
vezes sua obra preferida, os sete volumes de Em Busca do Tempo Perdido, de
Proust, da qual guardava uma raríssima primeira edição francesa. Depois de
Proust, Balzac ocupou sua imaginação por mais tempo. Em sua inúmeras visitas
ao órgão do Banco do Brasil responsável pelas importações, o empresário da
Metal Leve, obrigado a longas horas de espera nos corredores, devorou quase
toda A Comédia Humana.
Nascido em São Paulo, em 1914, Mindlin estudou Direito na USP e fez cursos
de extensão universitária na Universidade de Columbia, em Nova York. Aos 32
anos, financiado por um empresário, conseguiu um sócio e fundou a livraria
Parthenon, em São Paulo, especializada em livros raros. A guerra havia
acabado há um ano e famílias europeias descapitalizadas se desfaziam de seu
patrimônio artístico e literário. Foi assim que Mindlin trouxe para o Brasil
muitas raridades que colocou à venda na Parthenon, sempre avisando o
comprador que poderia procurá-lo no futuro, caso quisesse se desfazer do
livro. O conflito entre vendedor e colecionador cresceu com o tempo. Mindlin
não resistiu e foi atrás de todos as obras raras vendidas, recomprando-as
para sua biblioteca particular quando virou empresário.
Foi quando vendeu a Metal Leve, dirigida por durante 46 anos, que o
empresário começou a pensar no futuro de sua biblioteca. Inspirado no modelo
da John Cater Brown Library, de Providence (Rhode Island), que também
começou como coleção particular e hoje é uma das maiores do mundo em
documentos raros sobre a América, Mindlin, que integrava o conselho da
biblioteca, pensou em fazer um acordo com a USP para transferir seu acervo.
Parte dessa história está contada no livro Memórias Esparsas de uma
Biblioteca, um dos três volumes que Mindlin dedicou à maior coleção privada
do Brasil - os outros dois são Uma Vida entre Livros e Destaques da
Biblioteca de Guita e José Mindlin.
Sempre procurado por pesquisadores brasileiros e estrangeiros atrás de suas
raridades bibliográficas, Mindlin, um cidadão do mundo que dominava seis
línguas, foi um dos primeiros empresários a atravessar a Cortina de Ferro
durante a Guerra Fria, tentando aproximar o Brasil de países como a extinta
União Soviética. Teve também um papel fundamental no processo de
redemocratização do País ao assinar, durante a ditadura, um manifesto pela
abertura política junto a outros oito empresários.

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ARTIGO - A IMPRENSA JORNALÍSTICA PORTO-ALEGRENSE E OS ÚLTIMOS DIAS DO GOVERNO JOÃO GOULART


A IMPRENSA JORNALÍSTICA PORTO-ALEGRENSE E OS ÚLTIMOS DIAS DO GOVERNO JOÃO GOULART


Marcos Emílio Ekman Faber
Eduardo da Silva Severo
Ismael Wolf Ferreira

Resumo

Este artigo procura analisar comparativamente o discurso jornalístico porto-alegrense a respeito do governo de João Goulart e como a imprensa gaúcha se posicionou em relação ao seu governo. Os jornais analisados são: Diário de Notícias e Última Hora. A escolha destes dois jornais ocorreu em função da visão antagônica que tiveram do período. O referencial teórico adotado é o da Análise do Discurso e os autores de referência são Raoul Girardet e Eni Puccinelli Orlandi. A análise ocorrerá com a comparação dos discursos dos referidos jornais em comparação à historiografia sobre o período.
Palavras-chave: Imprensa porto-alegrense. João Goulart. Golpe de 1964.
1 Introdução
O governo e a deposição de João Goulart são de fundamental importância para a compreensão de como as forças conservadoras de direita abriram espaço para a chegada ao poder através do Golpe de 1964. A análise aqui apresentada é fundamentada na bibliografia disponível sobre o período e na análise de dois dos principais jornais porto-alegrenses da época: o Diário de Notícias e a Última Hora, ou seja, nossa análise está focada no olhar da mídia gaúcha sobre o governo João Goulart. A escolha destes dois jornais se deu pelo fato de que os dois terem posições políticas opostas a respeito do governo Goulart. A baliza temporal do artigo está nos últimos vinte e dois dias do governo Jango, ou seja, do dia 10 ao dia 31 de março de 1964, sendo que como o Golpe de Estado dado pelos militares ocorreu no dia 31 de março e, portanto, sendo noticiado somente no dia 1º de abril, analisamos os jornais deste dia e do dia seguinte ao Golpe que depôs o presidente João Goulart.
Acreditamos que a análise comparativa entre os jornais Diário de Notícias e Última Hora e a comparação destes com a bibliografia histórica do período é importantíssima na compreensão da luta ideológica travada pelos setores favoráveis a João Goulart e os setores de oposição na sociedade gaúcha de então. Pois interessa-nos compreender como e em que escala os setores conservadores associados à burguesia nacional conseguiram manipular a sociedade e criar as bases que possibilitarem o Golpe de 1964. Buscamos uma resposta na análise dos referidos jornais, porém conscientes de que a amostragem destes não reflete necessariamente a opinião da sociedade gaúcha como um todo, porém, servindo como parâmetro de como os principais setores da sociedade porto-alegrense pensava e entendia o governo João Goulart.
2 O pano de fundo do governo Jango
O governo Goulart iniciou de forma bastante controversa no dia 7 de setembro de 1961. João Goulart assumiu a presidência com poderes diminuídos, pois se tornou presidente num regime parlamentarista. A renúncia de Jânio Quadros, seguida de uma tentativa de Golpe de Estado pelos militares – que foi frustrada pela Campanha da Legalidade liderada por Leonel Brizola – geraram um clima de instabilidade política. Diante desta situação instável, o Congresso adotou uma "solução de compromisso" (FAUSTO, 2007, p. 443) para evitar um Golpe de Estado e uma possível Guerra Civil, o Congresso aprovou a mudança no sistema de governo brasileiro, passando do sistema presidencialista para o parlamentarista.
Desse modo, o parlamentarismo, proposto por muitos como fórmula capaz de dar maior flexibilidade ao sistema político, entrou em vigor pela porta dos fundos. Utilizado como simples expediente para resolver uma crise, não poderia durar muito, como de fato não durou. (FAUSTO, 2007, p. 443).
Nas palavras de Caio Navarro de Toledo "o governo Goulart nasceu, conviveu e morreu sob o signo do Golpe de Estado" (TOLEDO, 1982, p. 7), ou seja, quando tomou posse, Jango, já havia enfrentado uma tentativa de deposição mesmo antes de assumir a presidência e durante seu governo conviveu com a sombra conspiratória.
Essa conspiração anti-Jango, era explicada pela temeridade, por parte dos setores conservadores da sociedade brasileira, de um governo populista ao estilo getulista ou de que Goulart promovesse a construção de uma República Sindicalista de moldes peronista. Estas acusações, porém, tinham fundamento, pois estavam amparadas na experiência de João Goulart como Ministro do Trabalho de Getúlio Vagas. Neste ministério, João Goulart, promoveu a aproximação do governo Vargas com o proletariado, inclusive sendo o mentor do aumento do salário mínimo em 100% ainda durante o governo de Getúlio Vargas, o que fez com que a oposição respondesse com forte oposição ao seu nome (FAUSTO, 2007, pp. 413-415).
Quando João Goulart assumiu a presidência, os setores agrários e as oligarquias regionais, tradicionalmente anti-getulistas, ficaram automaticamente na oposição direta ao governo. Porém, conforme passava o tempo, outros setores da burguesia – comercial e industrial – passaram para a oposição, o que causou a surpresa dos intelectuais que faziam parte do governo Goulart, pois estes acreditavam que a burguesia eminentemente urbana estaria satisfeita com as transformações propostas pelas reformas que Goulart promoveria. Até mesmo a Igreja Católica colocou-se contra o presidente João Goulart. Mesmo que alguns setores da Igreja apoiassem declaradamente as reformas propostas pelo presidente, a cúpula hierárquica católica era contrária às políticas "comunistas" de Jango.
Quanto aos militares, que foram em parte os derrotados de 1961, estavam em estado de alerta. A Escola Superior de Guerra (ESG), fundada em agosto de 1949, e que tinha a missão de capacitarem militares e civis para "exercer funções de direção e planejamento na segurança nacional" (FAUSTO, 2007, p. 452). Tinha, nos anos 1960, a convicção de que "só um movimento armado poria fim à anarquia populista, contendo o avanço do comunismo" (FAUSTO, 2007, p.153).
Mas o parlamentarismo durou somente até janeiro de 1963, quando através de um plebiscito popular, o regime presidencialista venceu o parlamentarismo . Graças a esta vitória, João Goulart pôde governar sem a intermediação do Congresso, além disso, a vitória popular de Jango o fortaleceu e calou temporariamente a oposição. Aproveitando-se disso, Goulart lançou o Plano Trienal, de autoria do ministro Celso Furtado, porém, o Plano logo fracassou levando a situação a agravar-se novamente.
Foi então que João Goulart passou a empunhar a bandeira das Reformas de Base – reforma agrária, fiscal, bancária, eleitoral, universitária, etc. (TOLEDO, 1997, p. 35).
As reformas se impunham para atenuar as tensões sociais acumuladas que se expressavam através de conflitos visíveis e latentes. O caso da reforma agrária era exemplar. Era preciso aumentar a produção de alimentos, de matérias-primas para a indústria e criar no campo um mercado para bens manufaturados. Mas, principalmente, era preciso evitar a convulsão social. (TOLEDO, 1997, pp.35-36).
Fica claro, aqui, que as propostas de João Goulart não eram revolucionárias, pois atendiam às necessidades de desenvolvimento do capitalismo industrial brasileiro. Porém,
PSD e UDN, representando os interesses dos grandes proprietários rurais e de expressivos setores da Igreja Católica, negaram apoio a qualquer emenda constitucional que viabilizasse a reforma agrária proposta pelo governo. Com esta decisão, o Congresso Nacional demonstrava que o caminho das reformas seria difícil e tormentoso. (TOLEDO, 1997, p.36)
Entretanto, se isto explica as motivações e a adesão dos setores conservadores – ruralistas, latifundiários, etc. – da sociedade brasileira à oposição, não explica como a sociedade como um todo, especialmente a burguesia nacional, aceitou este discurso anti-getulista e de oposição a Jango.
Mas e quanto à mídia impressa gaúcha? Como dois dos principais jornais do Estado no período – Diário de Notícias e Última Hora – se posicionaram? Sendo que ambos os jornais enquadravam-se no gênero jornalístico opinativo (BONINI, p. 213), pois divulgam notícias com a opinião do jornal declaradamente expressada no texto. É sabido que os dois jornais representavam diferentes segmentos da sociedade gaúcha e, portanto, tinham pontos de vista distintos sobre o governo do gaúcho João Goulart.
O jornal Diário de Notícias era integrante do grupo Diários Associados, fundado por Assis de Chateaubriand, o Chatô. Chateaubriand era inimigo político de Getúlio Vargas, o que, portanto, fazia do jornal um natural opositor do governo Jango (RÜDIGER, 1993, pp. 60-65). Este jornal era a voz das classes conservadoras na sociedade gaúcha.
Já o jornal Última Hora , fundado por Samuel Wainer no Rio de Janeiro, mas que tinha uma versão de circulação nacional que era complementada por suplemento regional em Porto Alegre. Foi fundado para servir de respaldo ao getulismo junto à opinião pública. Segundo o próprio Samuel Wainer, seu objetivo era romper com "a formação oligárquica da imprensa brasileira e dar início a um tipo de imprensa popular e independente" (RÜDIGER, 1993, p. 65). Ao contrário do Diário de Notícias, a Última Hora era um representante do populismo no Rio Grande do Sul. Tratava-se de uma empresa privada de caráter nacionalista que defendia as políticas de industrialização e de fortalecimento do capitalismo no país.
O problema que levantamos e procuramos responder neste artigo é como a mídia impressa do Rio Grande do Sul respondeu a crise que culminou no Golpe de 64. A ênfase de nosso artigo recai sobre o olhar conservador da cidade, ou seja, principalmente sobre o jornal Diário de Notícias, porém, em contraponto com o jornal Última Hora.
Por tratar-se de análise de textos, o referencial teórico será o da Análise do Discurso e os autores selecionados foram Raoul Girardet (1987) e Eni Puccinelli Orlandi (1993).
3 O Olhar da Mídia Porto-Alegrense
Analisamos dois temas que acreditamos serem os mais pertinentes nos últimos dias do governo João Goulart e que tiveram ampla cobertura da mídia gaúcha: as reformas pronunciadas no comício da Central do Brasil (reforma agrária e encampação das refinarias) e o confronto oposição/defesa à liderança e legitimidade de João Goulart como presidente do país.
Iniciamos nossa análise pelo dia 10 de março de 1964.
Quando os comunistas advogam a convivência pacífica com os católicos, procedem exatamente como o leão solto no rebanho das gazelas. Não devora todas ao mesmo tempo, e as que são poupadas iludem-se, acreditando que acompanham um amigo. (DIÁRIO DE NOTICIAS, 10/03/64, p. 1).
O editorial do jornal Diário de Notícias deste dia, o primeiro que analisamos, é cheio de simbolismos, pois o editorial faz uma associação entre uma notícia do PRAVDA – órgão oficial do Partido Comunista Russo – pregando o ateísmo à outra notícia do dia que falava sobre padres e bispos brasileiros que apoiavam a legalidade do Partido Comunista no Brasil. Na mesma edição, o jornal afirma que o comício do presidente João Goulart na Central do Brasil será promovido pelo partido comunista. É importante lembrar que neste momento o mundo vive o clima da Guerra Fria e, no campo internacional, o Brasil adotou a Política Externa Independente, não se alinhando aos Estados Unidos. Também é importante que neste momento, o medo do comunismo é muito forte na sociedade brasileira e o Diário de Notícias associa o comunismo à figura do presidente.
O tema da conspiração maléfica sempre se encontrará colocado em referência a uma certa simbólica da mácula: o homem do complô desabrocha na fetidez obscura; confundido com os animais imundos, rasteja e se insinua; viscoso ou tentacular, espalha o veneno e a infecção (GIRARDET, 1987, p. 17).
O Diário de Notícias associa o comunismo ao maligno, e associa a figura do presidente a este maligno. Ao afirmar que o comunismo é anti-católico, indiretamente está afirmando que o presidente também o é. Esta prática será muito utilizada no discurso do Diário de Notícias como veremos nas manchetes e nos editoriais do jornal.
Por outro lado, o jornal Última Hora, do mesmo dia, estampa em sua capa de circulação nacional a manchete "Jango: revolução financeira para o progresso do Brasil" o jornal saúda a iniciativa do presidente, inclusive afirmando que "o presidente teve uma recepção triunfal por parte dos estudantes da Universidade do Brasil" (UH, p. 1) para quem ele liberou uma verba de 1 bilhão e 500 milhões de cruzeiros. Ao contrário do Diário de Notícias, a Última Hora refere-se ao presidente João Goulart com otimismo, utilizando expressões como "progresso" e "recepção triunfal", exaltando a pessoa do presidente.
No dia 12, o Diário de Notícias dá a seguinte manchete "Organismos Espúrios Comandam a Desordem", a manchete era em referência ao título do manifesto das Classes Produtoras do Rio Grande do Sul que afirmava que "A causa principal dos males reside no desvirtuamento da autoridade civil, que faz o jogo da investidura totalitária, transigindo ostensivamente com os comunistas". O editorial do mesmo dia afirma que as Reformas de Base são extremante perigosos para a ordem social, "desde Lênin, o lema predileto da demagogia bolchevista tem sido retalhar e distribuir ao povo grandes propriedades territoriais" (DN, p. 4).
Já o editorial do Diário do dia 13 de março, dia do comício da Central do Brasil, referindo-se à eleição de Ranielli Mazzilli, aliado de João Goulart, à presidência da Câmara que:
O enfraquecimento do Congresso num momento em que o presidente da República já fala em 'instituições caducas' – paráfrase daquele dístico getuliano: 'voto não enche a barriga de ninguém' – é um fenômeno alarmante para os democratas. Qual o preço que o Sr. João Goulart pagou por essa vitória na Câmara? Nenhum. Veio-lhe gratuitamente às mãos. (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 13/03/64, p. 4).
Novamente, o discurso do Diário de Notícias associa a imagem do presidente ao totalitarismo e ao comunismo, o que, como veremos, será uma prática corriqueira do jornal. Porém, o que mais chama a atenção na edição deste dia é a manchete principal "Quase Metade do RGS está Sujeita à Desapropriação" e no corpo da notícia afirma que "nada menos que 41,9% das terras do RS são desapropriáveis". Não por coincidência a notícia estampa o jornal no dia em que o presidente da República, João Goulart, faria seu pronunciamento lançando a SUPRA – Superintendência da Reforma Agrária –, que declarava sujeitas a desapropriação propriedades subutilizadas com mais de cem hectares e que fizessem limite com estradas ou ferrovias federais, ou seja, certamente não formavam 41,9% das terras gaúchas, mas o jornal inspirava o medo do fantasma comunista, que na opinião deste jornal se tornava mais real do que nunca.
Um artigo publicado na página 4 do Diário de Notícias simboliza o sentimento conservador da direita gaúcha sobre os movimentos políticos de João Goulart, "enquanto o movimento subversivo se alastra pelo país a fora, com o evidente objetivo de substituir as instituições vigentes por uma República sindical totalitária". Este mesmo artigo pedia aos militares para que deixassem de ser "apáticos" e se posicionassem contra Jango. Noutro artigo do dia era exposto o medo de um novo Golpe de Estado nos moldes do golpe dado por Getulio Vargas e que dera origem ao Estado Novo em 1937.
Já no jornal Última Hora do mesmo dia, o articulista José Mauro, afirma "decreto da SUPRA: vitória do povo" (UH, p. 3) e completa a coluna escrevendo que a oposição conservadora representada pela UDN e PSD já estava se organizando para barrar a aprovação da SUPRA no Congresso. A manchete de capa do jornal Última Hora destaca "Exército garante povo no comício da reforma" e no corpo da notícia declara
Mais uma vez o povo, em geral, e as classes trabalhadoras, em particular, irão hoje a praça pública para defender as reformas sem as quais o Brasil não poderá avançar no caminho da emancipação e do progresso (ÚLTIMA HORA, 13/03/64, p. 1).
Sobre a participação do Exército, a mesma notícia afirma que
(...) é que o povo terá a protegê-lo as Forças Armadas nacionais. O governador Lacerda e seus cúmplices tudo fizeram para criar em função do dia de hoje uma atmosfera de terror. Mas nada podem esses agitadores contra as Forças Armadas, escudo da lei e da ordem, expressão mais alta da soberania popular (ÚLTIMA HORA, 13/03/64, p.1).
Este dia, 13 de março, foi o que as divergências entre os dois jornais se mostraram mais claras. As diferentes posições ideológicas são demonstradas na simples comparação dos textos. Enquanto o Diário vê o movimento presidencial como um complô golpista, o jornal Última Hora exalta o ato por envolver a participação do "povo, em geral, e as classes trabalhadoras". Enquanto o primeiro cria um discurso sobre a gestação do iminente golpe presidencial, o segundo exalta a segurança que o Exército irá garantir contra "Lacerda e seus cúmplices", ou seja, para o jornal a Última Hora, os golpistas são Lacerda, governador da Guanabara, e "seus cúmplices" e não o presidente.
Segundo Raoul Girardet, o mito da conspiração maléfica, que é natural no imaginário popular de qualquer sociedade, necessita de um contra-complô (1987, p.60), ou seja, ambos os jornais afirmam que o outro lado é o lado maléfico. O outro é sempre o lado que está preparando o golpe para a tomada do poder, portanto, ambos os jornais clamam para que seja preparado o contra-Golpe.
O dia seguinte ao comício da Central do Brasil, após a população gaúcha assistir pelo rádio e pela televisão aos pronunciamentos de Jango, Brizola e outros, o Diário de Notícias estampou a manchete "Encampadas todas as Refinarias" em alusão a estatização das refinarias pela Petrobras. Noutra notícia de capa, o jornal afirma que "Impeachment de Jango marcará abertura dos trabalhos no Congresso". Em referência ao comício, o editorial do Diário afirma que os "foguetórios de uma turma de energúmenos" que assistiram ao presidente e seus partidários. E segue afirmando que o presidente e seus seguidores pretendem "tumultuar a vida dos campos, complementando, desse modo, a anarquia das cidades", e prossegue afirmando que
o decreto SUPRA, insistimos, não passa de uma manobra de aliciamento político, destinada a concentrar nas mãos dos validos de copa e cozinha da República a maior soma de poder jamais vista neste país. Uma demagogia criminosa (...) Um clamoroso atentado contra a estrutura social e econômica do Rio Grande (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 14/03/64, p. 4).
Ao falar em perda de propriedade e encampação de empresas privadas, o jornal trabalhava o temor de um eminente regime totalitário-comunista que, segundo o jornal, estaria se instalando no seio do país. Esse tema será importante para incluir a classe média, principalmente os católicos, na oposição ao governo de Jango.
Em contrapartida, a Última Hora estampa na capa "O povo com Jango, começa a reforma", o jornal saúda a iniciativa de Jango e cita que "foi o maior comício da História do Brasil". Como ocorrera com Vargas, o jornal associa a figura do presidente Goulart com a imagem do povo. O jornal é cheio de fotos do comício, fotos onde aparecem as massas eufóricas saudando o presidente.
É importante salientar que desde seu anúncio, o comício da Central do Brasil, mobilizou o movimento sindical, o proletariado, os movimentos estudantis e as esquerdas, "mas acirrou os ânimos da direita" e "uma classe social poderosa mobilizou-se contra as reformas de Goulart: os capitalistas" (FERREIRA, 2003, p. 382).
A partir do dia 13 de março, uma sexta-feira 13, "o conflito político entre os grupos antagônico se redimensionou" (FERREIRA, 2003, p. 400) e o mesmo pôde ser percebido no discurso dos dois jornais.
No domingo, 15 de março, o Diário de Notícias estampa em sua capa "Parlamentares sugerem medidas radicais contra o presidente". Em outra notícia de capa citam "Lacerda: Goulart já não sabe o que faz".
Com isso, o Diário de Notícias passa a alternar, conforme o dia, manchetes em que o presidente estaria tramando um golpe de Estado para obter mais poder político, com notícias que sugerem a falta de comando do presidente. Esta sobreposição de notícias leva a uma confusão no leitor, e faz parecer que o governo estava imerso em um grande caos.
O fato de os decretos das desapropriações e das encampações não terem, de logo, provocado agitações dos 'sem terra' ou de pelegos sindicais, não deve ser tomado como sinal de que as coisas poderão, afinal, acomodar-se ou que talvez se tivesse feito barulho em demasia em torno de medidas aparentemente inocentes do governo federal. (...) A absorção das refinarias nas mãos dos comuno-nacionalistas e sindicalistas. (...) Terá a nação, terão o Exército, a Marinha e a Aeronáutica, terão as correntes democráticas e cristãs capacidade de reação contra (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 15/03/64, p. 4).
O editorial do Diário de Notícias critica as desapropriações e encampações, chamando a sociedade gaúcha para a reação, onde novamente se refere a "absorção das refinarias nas mãos dos comuno-nacionalistas e sindicalistas" (DN, p.1). Já a Última Hora declara apoio às medidas de Jango, dedicando a isto uma coluna inteira onde detalha todo o decreto de encampação das refinarias, inclusive publicando na íntegra o decreto presidencial, que deixa claro que a encampação das refinarias atendia a política nacionalista de seu governo.
É curioso que, neste mesmo dia, os dois jornais publicaram uma nota da Petrobras onde esta saúda "ao povo gaúcho" pela conquista popular, referindo-se à encampação das refinarias.
No dia 17, é publicada na capa do Diário de Notícias uma nota da FIERGS que afirma "apreensão diante das medidas que vêm sendo tomadas" pelo presidente. Já o editorial do Diário de Notícias fala do comício de Jango como
a mais Extemporânea das manifestações totalitárias de que há notícia. Extemporânea e ilegal, pois começou pelo solene desprezo do que leis e regulamentos claramente prescrevem (...) no comício falou-se mais ou menos em português, mas o recheio foi russo (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 17/03/64, p. 4).
Novamente, o governo Jango era associado ao totalitarismo e ao comunista.
O jornal Última Hora do mesmo dia estampa em sua capa "Oposição em desespero: derrubar Jango antes da reforma":
Quem lesse o noticiário de ontem, diria que a Nação foi coberta por uma cortina de pânico. Não é verdade. Quem está em pânico é uma ínfima parcela da população. Ínfima, mas poderosa, e que, pelos seus imensos recursos de divulgação e pressão, procura, como o sapo da fábula, parecer elefante, representando todo o país (ÚLTIMA HORA, 17/03/64, p.1).
No dia 20 de março o editorial do jornal a Última Hora refere-se à Marcha da Família com Deus pela Liberdade como uma tentativa de golpe contra as reformas anunciadas pelo presidente, tendo a clara manchete "Revolução contra as Reformas" (UH, p.1). Já o Diário de Notícias exalta a Marcha da Família com Deus pela Liberdade afirmando em seu editorial que
Estamos vivendo momentos de indisfarçável gravidade. A sensação do perigo está em todos os espíritos. E o fato de as forças democráticas se verem na contingência de sair às ruas para defender o regime, é uma amostra de que, continuasse a omissão, os totalitários já teriam sepultado a democracia brasileira. Felizmente esta possui vitalidade para sobreviver mesmo aos maiores embates – conforme se posicionou em Minas e São Paulo (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 20/03/64, p. 4).
É importante frisar que enquanto um dos veículos de comunicação associa o presidente como sendo o ser maléfico e golpista (GIRADET, 1987, p.17), o outro jornal faz a mesma associação à oposição. Ambos referem-se ao opositor como sendo o usurpador e o antidemocrata. O Diário acusando Jango de comunista e a Última Hora acusando a direita de promover o caos social e desestabilização do regime. Ambos identificam a oposição como uma representação do mal, "o Mal apreendido como simples e exata inversão do bem, o tema não se limita, para dizer a verdade, à exploração do exclusivo domínio do imaginário político" (GIRARDET, 1987, p.62).
Curiosamente a manchete do Diário de Notícias do dia 22 de março diz "Unidos contra o golpe seis grandes Estados" se referindo aos Estados de São Paulo, Guanabara, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. Esta manchete é uma inversão de papeis, pois os referidos Estados, que foram coniventes com o Golpe em 31 de março, eram aqui expostos como unidos contra um suposto golpe de Jango. Notícia semelhante está no dia 24 de março onde o jornal dá a manchete de que "Jango sonda o Congresso para o golpe na Constituição". No editorial intitulado "o Velho e o Moço", sendo Getúlio Vargas, o velho, e o João Goulart, o moço:
Democracia? Constituição? Partido? Congresso? Tudo isso nada vale para o moço (...) Por isso, o moço sempre considerou tais palavras como peças de máquina de espoliação (...) O moço tem um território místico onde cultiva com respeitável sinceridade o que ouviu do velho. Infelizmente, para todos, o moço não conheceu bem o velho (...) Será possível corrigir o moço – que já não é tão moço – o astigmatismo que adquiriu por contágio ao velho (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 24/03/64, p. 4).
O editorial do Diário do dia 26 de março afirma que "nesses tempos modernos em que uma facção soviética se apoderou do comando nacional" (DN, p. 4). E numa coluna não assinada afirma que "os dias de imprensa livre estão contados", pois "a Voz do Brasil (...) já não é mais um simples noticioso da Agência Nacional: entrou no padrão DIP, ao velho estilo estadonovista" (DN, p.4). Novamente é feita a associação entre João Goulart e o Estado Novo de Vargas.
No dia 27 de março, uma Sexta-Feira Santa, o Diário de Notícias faz um apelo aos cristãos do Rio Grande do Sul
que a mística desta data sagrada para a cristandade ilumine todos nós que livre nascemos (...) Cristo subiu ao Gólgota pela redenção da criatura humana. Inspiremos-nos no exemplo do mestre: estejamos prontos para dar a vida pela liberdade, porque à servidão a qualquer forma de ismo é preferível o sacrifício supremo (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 27/03/64, p. 4)
No dia 29, o editorial aconselha: "Inspiremo-nos no grande mestre: arrestemos com a morte, se necessário, na luta contra os anti-Pátria, por amor ao Brasil" e prossegue "criaram o Leviatã, a alternativa é uma só: ou ele ou nós". Para o Diário de Notícias o golpe estava legitimado pela própria ação presidencial.
São simbólicas as edições dos dois jornais em 1º de abril de 1964, dia seguinte ao Golpe Civil-Militar, enquanto o jornal Última Hora trata deste acontecimento com pesar e tristeza, e clama pela legalidade, o Diário de Notícias exalta o ocorrido com a seguinte manchete "Minas se levanta contra Jango" e no corpo da notícia exalta a figura do general Mourão Filho, "um herói da II Guerra Mundial" (DN, p. 1). A Última Hora dá a manchete de "Sublevação em minas para depor Jango" e atribui uma frase ao presidente João Goulart: "O Golpe está condenado". Enquanto o Diário de Notícias fala em levantar-se contra Jango a Última Hora fala em Golpe de Estado e clama pela legalidade.
No editorial o Diário de Notícias, este afirma que "a nação não tinha alternativa" e prossegue afirmando que:
O comício de sexta-feira, 13 de março, já fora suficientemente claro. Exibia, com nitidez diáfana, intenções liberticidas, até então apenas suspeitas (...) O motim naval da quinta-feira santa era o desafio aberto. Levava os quartéis a mazorca vestida de reformista. Apunhalavam-se as Forças Armadas no que elas têm de fundamental e intocável: a hierarquia e a disciplina (...) O show no Automóvel Clube foi a gota final (...) a legalidade estava irremediavelmente golpeada (...) Criado o monstro num impulso passional próprio do nosso povo generoso e fiel aos ideais de liberdade, cumpria agora, corrigir o erro fatal (...) Saibamos ganhar a vitória, a fim de que o triunfo sobre as forças totalitárias não se converta num melancólico 1º de abril. (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 1º/04/64, p. 4).
Quando o Diário de Notícias se refere à destituição de João Goulart como um "triunfo sobre as forças totalitárias", fica claro como o Golpe de 64 foi recebido pelos setores conservadores da sociedade gaúcha. Ao posicionar-se contra o governo João Goulart, o Diário de Notícias apelava para o temor do totalitarismo e do comunismo, mas é curioso que este mesmo órgão apoiou um regime ditatorial militar de direita. No discurso defendia a democracia, mas ideologicamente posicionou-se ao lado dos golpistas que pulverizaram o mesmo regime democrático que afirmavam defender. Enquanto no discurso diziam-se democratas e favoráveis ao respeito às leis, na prática foi golpista e contrária a legalidade.
Já o colunista Paulo Francis, do jornal Última Hora, afirma que o presidente João Goulart
compreendeu perfeitamente a missão histórica que desempenha, seu mandato já não é seu, mas uma bandeira de aspirações nacionais. O político populista de ontem tornou-se o agente histórico de hoje. A mensagem das reformas é irretocável, aconteça o que acontecer agora. (...) O Golpe está ai, repito, mas não será dado por telefone, pela divulgação em massa do terror ideológico. Pode-se enganar todo o povo parte do tempo, mas não todo o povo todo o tempo (ÚLTIMA HORA, 1º/04/64, p. 4).
Pelo discurso, Paulo Francis parece convocar o povo e as esquerdas para a resistência, porém, esta não aconteceu.
A edição nacional do jornal Última Hora do dia 02 de abril, descreve o atentado sofrido pela sede do jornal, no Rio de Janeiro, que foi depredada e incendiada: "Toda a frota de reportagem destruída a bala e a fogo", ao lado desta reportagem consta uma nota de João Goulart solicitando ao povo gaúcho que não se sacrifique. E segue com o agradecimento de Leonel Brizola:
Encerramos aqui a "Rede da Legalidade" agradecendo a todo o povo gaúcho e brasileiro que compareceu em massa a sede da Prefeitura de Porto Alegre para resistir contra os golpistas. Fizemos tudo para manter a legalidade (ÚLTIMA HORA, 02/04/64, p. 1).
Assim, de forma melancólica, encerrava-se o governo João Goulart.
4 Conclusão
Raoul Giradet (1987, p.17) afirma que o tema da conspiração maléfica sempre se encontrará colocada em referência a "uma certa simbólica da mácula", ou seja, no caso de João Goulart, seus opositores necessitavam associá-lo a algo que a sociedade temesse, por isso a insistência em associá-lo ao comunismo ou a um usurpador, criando a imagem de que ele iria utilizar-se do expediente golpista para criar um regime totalitário.
Aparentemente, estas acusações não faziam sentido, pois Goulart não possuía a força política que seus inimigos faziam parecer que ele tinha. Mas, segundo Eni Puccinelli Orlandi (1993), "do sem-sentido se faz novo sentido através da mudança do discurso (...) o discurso fundador é aquele que constrói um novo imaginário social" capaz de gerar novos significados sobre a realidade representada, porém, não se fazendo sozinho, mas sendo construído (ORLANDI, 1993, p.11-25). Uma das estratégias dos opositores de Goulart foi o de construir um discurso que desqualificasse a pessoa do presidente retratando-o como hesitante e desequilibrado, e, ao mesmo tempo, associando-o a algo que a sociedade como um todo temesse, ou seja, associando-o ao comunismo ou, nas palavras do próprio Diário de Notícias, a um "anti-Pátria". Como a maior parte da sociedade gaúcha era temerosa do comunismo e não desejava o retorno de um regime totalitário, os opositores de Jango investiram, com sucesso, nesta associação. Além disso, a associação da imagem de Jango com o comunismo o afastava das classes médias e dos setores progressistas da Igreja.
Não restam dúvidas de que a cobertura do Diário de Notícias, neste período, era de conspiração ao regime democrático. Porém fazendo parecer que eles – Diário de Notícias – eram os defensores da liberdade e da democracia, enquanto que o presidente e seus partidários eram descritos como conspiradores que iriam acabar com a democracia no país. Segundo Girardet, essa inversão nos papéis era necessária, pois somente quando o outro é associado à representação do mal, é que se pode assumir o papel do salvador (GIRARDET, 1987, p. 62).
Por outro lado, o jornal a Última Hora, como um veículo de informação partidário do populismo e aliado aos interesses da burguesia urbana, defendia o regime com unhas e dentes, pois era sem dúvida um dos beneficiados com o regime de Goulart. Para a defesa de Jango, utilizava das mesmas ferramentas que o jornal opositor, ou seja, inspirava o medo do golpismo. Não era, portanto, um defensor da legalidade como se dizia ser, mas era, isso sim, defensor dos seus próprios interesses.
Mas e como explicar as mudanças na sociedade porto-alegrense e seu posicionamento em relação aos diferentes discursos da mídia?
Os quase três anos passados entre a posse de João Goulart e o Golpe de 64, nos deixam a nítida impressão de que a burguesia nacional, não era tão nacionalista quanto João Goulart acreditava. Pois, como afirma Caio Navarro de Toledo, "o nacionalismo da burguesia brasileira sempre teve uma caráter pragmático" (1982, p. 117), ou seja, dependendo das circunstâncias e das suas conveniências a burguesia brasileira se opõem ou se associa ao capital internacional. Quando percebeu a crise econômica desencadeada pelo fracasso do Plano Trienal e com a Lei de Remessas de Lucros, a burguesia voltou-se contra o governo que criara tais medidas. Ao mesmo tempo, a crise desencadeara um avanço político-ideológico das classes populares e trabalhadoras. O crescimento progressivo da politização e da atuação das classes populares fez com que os setores da direita conservadora explorassem o medo de que a solução popular não passasse por uma solução burguesa, mas que fosse buscada na radicalização do movimento (TOLEDO, 1982, p. 119-120). Por outro lado, o presidente sem apoio dos setores dominantes da sociedade brasileira, buscou nas classes populares o seu aliado, numa tentativa de reforçar o populismo, o regime democrático e a luta pela legalidade.
Neste contexto, os dois jornais porto-alegrenses aqui analisados eram representantes destas formas distintas de pensar a política brasileira. O Diário de Notícias, representante das camadas conservadoras, combatia o regime com todos os argumentos possíveis e, por outro lado, o jornal Última Hora, defensor da política populista-nacionalista, apoiava o regime em vigor, pois era temerosa do que enfrentaria no caso da derrota do regime democrático, como de fato ocorreu, pois poucos meses depois do Golpe de 64, o jornal fechou as portas.
Referências:
BONINI, Adair. Os Gêneros do Jornal: o que aponta a literatura da área de comunicação no Brasil? Disponível em: <http://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/0401/13%20art%2011%20P.pdf> Acessado em 27 de mar. de 2008.
FAUSTO, Bóris. História do Brasil. 12ª ed. São Paulo: EDUSP, 2007.
FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O Brasil Republicano: o tempo da experiência democrática – da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
GIRARDET, Raoul. Mitos e Mitologias Políticas. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
IANNI, Octávio. O Colapso do Populismo no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1994.
ORLANDI, Eni Puccinelli (org.). Discurso Fundador: fundação do país e a construção da identidade nacional. Campinas: Pontes Editores, 1993.
ROCHA, Décio; DEUSDARÁ, Bruno. Análise de Conteúdo: Aproximações na (re)construção de uma trajetória. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/alea/v7n2/a10v7n2.pdf>. Acessado em 26 de out. de 2008.
RÜDIGER, Francisco. Tendências do Jornalismo. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 1993.
TOLEDO, Caio Navarro de (org.). 1964: Visões Críticas do Golpe: democracia e reformas no populismo. Campinas: Ed. UNICAMP, 1997.
TOLEDO, Caio Navarro de. O Governo Goulart e o Golpe de 64. 10ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1982.
VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. 2ª ed. São Paulo: Brasiliense, 2004.


REFERÊNCIA PARA CITAÇÃO DESTE ARTIGO:
FABER, Marcos Emílio Ekman; ...SEVERO, Eduardo da Silva; ...FERREIRA, Ismael Wolf. ..... A

 Imprensa Jornalística Porto-Alegrense e os Últimos Dias do Governo João Goulart Disponível em: <http://www.historialivre.com/brasil/goulart1.htm> Acesso em: 22 de janeiro de 2009.


Este artigo pode ser utilizado e publicado em outros sites desde que citada a fonte:
Autor: Marcos Emílio Ekman Faber
Disponível em
http://www.historialivre.com/
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OS GREGOS E A FILOSOFIA PLAGIADA DOS AFRICANOS

sábado, 27 de fevereiro de 2010


A filosofia grega é ensinada como a origem do pensamento reflexivo, intelectivo e criador humano e que a civilização Greco-romana nos legou todas as boas exformações, as tinha como referências no aprendizado filosófico e pedagógico...
Os europeus através dos séculos têm usado a manipulação para omitir, mentir, dominar e excluir, quando na verdade, foi à África o continente criador da filosofia, documentos históricos comprovam que Sócrates, Aristóteles, Platão e tantos outros buscaram na África seus conhecimentos...
Leia o artigo e acesse o livro STOLEN LEGACY (O LEGADO ROUBADO) de George G. M. James no Blogger no CNNC/BA:
http://cnncba.blogspot.com/
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Rio de Janeiro: 445 anos


Rio de Janeiro: 445 anos

26/02/2010 Notícias do Portal UERJ Eventos:

Era 1º de março de 1565. Em uma praia próxima onde hoje está o Pão de Açúcar, o militar português Estácio de Sá fundava a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro e começava o processo de expulsão dos franceses que, na época, ocupavam o litoral carioca. Igrejas, ruas centenárias e outros marcos compõem o cenário que conta os 445 anos de história da cidade. E será percorrendo estes pontos geográficos que a UERJ comemorará o aniversário da cidade realizando mais uma edição do projeto Roteiros do Rio, do Instituto de Geografia. A proposta é trazer para os dias atuais a história iniciada às margens da Baía de Guanabara.
São três opções de caminhadas agendadas para o dia 1º de março. A primeira começará às 9h30 parte da  Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos (rua Uruguaiana) indo até a Catedral Metropolitana. Já a segunda tem início marcado para às 15hs e sairá da igreja da Glória rumo ao Museu da República, no Catete. Quem optar pelo roteiro noturno, o ponto de encontro será nas escadas da Casa França- Brasil às 20h30, e termina na Cinelândia, em frente ao Odeon.
A participação é gratuita e aberta ao público.
As inscrições devem ser feitas pelo telefone: 88717238 ou pelo e-mail: roteirosgeorio@uol.com.br

www.roteirosdorio.com  
A coordenação é do professor João Baptista Ferreira de Mello e o projeto conta com a participação dos bolsistas  Ricardo Brenelli  e   Ivo Venerotti e das mestrandas Melissa Anjos  e  Olga Maíra Figueiredo.


Confira a seguir os roteiros organizados pelo projeto para esta segunda-feira 1º de março:


ROTEIRO 1:


"AS CATEDRAIS DE SÃO SEBASTIÃO DO RIO DE JANEIRO"
Dia 1º de março de 2010.
Encontro: 9h30 - Em frente à Igreja de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos (rua Uruguaiana);
Roteiro:
• Igreja das Irmandades Negras de Rosário e Benedito  (abrigou a Catedral de São Sebastião entre 1737 e 1808), templo no qual a Corte Portuguesa agradeceu a viagem bem sucedida em março de 1808 e, mais tarde, tornou-se sede da Câmara;
• Rua da Vala/Rua Uruguaiana (metrô do Rio de Janeiro);
• Rua do Rosário – Igreja de Santa Cruz dos Militares (abrigou a Catedral de São Sebastião de 1734 a 1737):
• Rua 1º de Março – Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé e do batizado de Isabel de Bourbon e Bragança (abrigou a Catedral de São Sebastião de 1808 a 1976):
• Rua Sete de Setembro (antiga Rua do Cano) – a requalificação da Rua da Quitanda;
• Rua São José – Largo da Carioca – Esplanada de Santo Antônio – Catedral Metropolitana de São Sebastião do Rio de Janeiro (sagrada a o final dos anos setenta).


ROTEIRO 2:


"DESCORTINANDO AS GEOGRAFIAS DO CATETE, FLAMENGO  E  GLÓRIA"
Dia 1º de março de 2010
Encontro: 15 horas – Alto do Adro da Igreja de Nossa Senhora da Glória.
Roteiro:
• Igreja da Glória (visita) – Plano Inclinado;
• Praça do Russel – Memorial Vargas (visita);
• Flamengo (Uruçumimim dos indígenas e Henriville da França Antártica);
• Castelinho (visita) – Rua Dois de Dezembro;
• Travessa Pinheiro;
• Rua Machado de Assis;
• Galeria do Cinema São Luis;
• Largo do Machado;
• Rua Bento Lisboa;
• Rua Artur Bernardes;
• Rua do Catete – Museu da República (antigo Palácio do Governo Federal).



ROTEIRO 3:


 "CAMINHANDO ENTRE LUZES NO CENTRO DO RIO À NOITE"
Dia 1º de março de 2010
Encontro: 20h30 - Casa França-Brasil.


Roteiro:
• Luminoso Centro Cultural Banco do Brasil –  Casa França-Brasil do Rio Joanino;
• Igreja Nossa Senhora da Candelária:Fonte de Luz e de Fé;
• O Iluminamento do Centro Cultural dos Correios;
• Rua Primeiro de Março;
• O Foco de Luz do Antigo Senado e da Catedral de Benedito e da Senhora do Rosário;
• O Diálogo do Rio Colonial Com a Cidade Maravilhosa: O Varandão do Centro Cultural da Justiça Eleitoral;
• Rua Do Ouvidor: Logradouro inicial da Iluminação a Gás e da Energia Elétrica;
• Confeitarias e Lojas Elegantes;
• Sobrado da Travessa do Comércio;
• Antiga Catedral Da Sé/Igreja do Carmo;
• Convento dos Carmelitas;
• Paço Imperial e da Luminar Isabel de Bourbon e Bragança;
• Os Refletores Sobre Tiradentes e Alerj
• O Brilho e o Requinte dos Antigos Ministérios da Fazenda, do Mec e do Trabalho
• Rua Santa Luzia
• Academia Brasileira de Letras
• Novas Torres Da Esplanada Do Castelo.
• Cinelândia, Theatro Municipal e Biblioteca Nacional, O Boêmio Amarelinho, A Câmara dos Vereadores/Palácio Pedro Ernesto.
• Centro Cultural da Justiça Federal;
• Cine Odeon – Metrô.
                                                            
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Livro de Ubiratan Machado ganha segunda edição ampliada


Livro de Ubiratan Machado ganha segunda edição ampliada

No período da Guerra do Paraguai, enxurrada poética cantando a rápida vitória que não veio encheu as páginas dos jornais.
IDEIAS & LIVROS - Alvaro Costa e Silva, Jornal do Brasil

RIO - Faça guerra, não faça amor. Este poderia ser o slogan da geração literária – em esmagadora maioria poetas e muito jovens – que floresceu no período de maior prosperidade do Segundo Império. Ao menos é o que se deduz da leitura do estudo A vida literária no Brasil durante o romantismo, de Ubiratan Machado, que acaba de reaparecer em segunda edição revista e ampliada.

No capítulo "Em defesa da pátria" – que como epígrafe leva o "Brava gente brasileira", verso que Evaristo da Veiga pôs no Hino da Independência – lembra-se a Questão Christie, uma besteirada que serviu para mostrar como que em meados do século 18 estavam exaltados e belicosos os ânimos no país. No fim de 1862 três oficiais britânicos da fragata Fort, ancorada no Rio, praticaram todo tipo de baderna na Tijuca. Estavam alcoolizados e deram bengaladas num policial. Foram metidos no xadrez. Até aí nada demais. O ministro plenipotenciário britânico, William Dougal Christie, exigiu satisfações do imperador Pedro II, não as teve, informou o início de represálias e, valendo-se de buques de guerra, mandou apresar cinco navios brasileiros.

Ao ser divulgada a notícia, o Rio ferveu contra os beefs. "Listas, apelos, subscrições, desaforos com todas as letras, muitos poemas e quilômetros de prosa são publicados nos jornais, ameaçando os ingleses", conta Ubiratan Machado no livro. Com 25 anos, Machado de Assis escreveu o Hino dos voluntários, musicado pelo maestro Júlio José Nunes e cantado pela atriz portuguesa Emília Adelaide no Teatro Ginásio, que mostra bem como andava o clima: "Brasileiros! Haja um brado/ Nesta terra do Brasil./ Antes a morte do honrado/ Do que a vida infame e vil".

Só em 1865 é que as relações entre os dois países seriam plenamente restabelecidas, pois eclodira a Guerra do Paraguai. E então o gosto de sangue teve ainda mais motivos para se fazer sentir.

No início a indignação contra os paraguaios misturou-se à soberba: como eles resistiriam ao império brasileiro? Uma enxurrada poética cantando a rápida vitória encheu páginas e páginas de periódicos. Com 16 anos, Joaquim Nabuco exigiu: "Corra-se ao campo inimigo/ A vingar a nossa honra,/A honra desta nação./ A quem vive em barbárie,/ Que não atende à justiça,/ Fale a metralha e o canhão". Sem noção, propunham o genocídio, como este poetastro anônimo, que espumou ódio no seu Hino dos voluntários da pátria: "Seja a guerra de extermínio,/ Não haja contemplação;/ Somente desta maneira/ Será vingada a nação.// Os guaranis e agacés/ De uma vez aniquilemos,/ Essa raça de bandidos/ Que ainda tão perto temos".
Logo após a expulsão dos paraguaios de Mato Grosso e a queda de Montevidéu, 95 estudantes do Recife, entre eles Castro Alves e Fagundes Varela, alistaram-se. Chamados de "leões do Norte", ao som de fanfarras, pareciam rumar para uma festa. Mas o governo recusou-se a usá-los como bucha de canhão. Preferiu "os voluntários a pau e corda", ou seja, os caçados a laço, e os escravos, muitos deles em substituição aos recrutados de famílias ricas; a legislação da época permitia o recurso.

Uma das poucas vozes a discordar da retórica exaltada – que continuou até o dia em que Solano Lopes caiu morto pelas mãos de um lanceiro conhecido como Chico Diabo e mesmo depois, com a chegada à pátria dos inválidos – foi José de Alencar, que fez um folheto chamado A festa macarrônica, dizendo que o Brasil, para manter a guerra, contraíra uma imensa dívida nos centros financeiros de Londres.

Mas quem quer saber disso quando se é jovem e poeta? Ubiratan Machado escreve que na época "a poesia era como as espinhas, os namoricos inconsequentes e a masturbação: uma característica da mocidade". Calcula que os autores de 80% dos livros de poesia publicados durante o romantismo estavam na faixa dos 18 aos 25 anos. Fazer versos era uma epidemia, que não poupava ninguém nas faculdades de direito de São Paulo e do Recife e nas de medicina do Rio e da Bahia, alunos da Escola Politécnica, futuros militares, empregados do comércio, "os primos de olho na prima, o namorado com dor de cotovelo ou com protuberância na testa" – e, é lógico, os vagabundos em geral. O negócio era versejar.

Estranhamente não eram da farra, segundo relata o autor no capítulo "Vida boêmia". Não combinavam com as tascas do Rio, onde se reuniam malandros, assaltantes e sicários, para beber cachaça ou vinho barato. O meretrício era formado quase que exclusivamente por escravas, cujos rendimentos iam para o baú dos senhores. O medo da sífilis era paralisante.
Não admira, pois, que os escritores românticos daqui tenham sido na maioria jovens posudos, sérios, formais: Gonçalves de Magalhães, Araújo Porto-Alegre, Joaquim Manuel de Macedo (este o autor do romance A moreninha, primeiro best seller de escritor nacional, mil exemplares logo esgotados na primeira edição de setembro de 1844. Sua estratégia de marketing foi encarregar escravos de vender o livro de porta em porta).

Ubiratan Machado arrisca uma hipótese para explicar comportamento tão estranho. Segundo ele, esses escritores tomavam como referência, modelo e explicação a figura de dom Pedro II: "Pareciam mimetizar os hábitos austeros e o procedimento do jovem monarca. (...) Como o imperador, eram homens sem grandes inquietações, amigos da ordem e das aparências, defensores intransigentes dos valores tradicionais da família brasileira. Seus ideais românticos aspiravam à estabilidade, e não à rebeldia, ou sequer à contestação social. Não se aventurariam a transgredir as normas da boa convivência, nem a perder a proteção imperial".

Quando o Rio começa a afrancesar-se, no meio do século 19, as coisas mudam um pouco. Algumas casas de espetáculo começam a se impor, apesar de Joaquim Manuel de Macedo identificar nos cafés-concerto o início da decadência de costumes na cidade. O mais chique e famoso deles, Alcazar Lyrique Français, ficava na Rua da Vala (atual Uruguaiana) e vivia botando gente pelo ladrão. Sobretudo devido à presença das mademoiselles Soalnge, Adèle, Gabrielle, Risette, Chatenay e, não por último, Aimée, a qual virou a cabeça até de Machado de Assis, que dela disse: "A graça parisiense toute pure".

A francesinha Aimée foi uma devoradora de fortunas, arruinou várias famílias, provocou crimes, e, quando o navio em que retornava à França cruzou a barra, deixando a Baía de Guanabara, as cariocas soltaram foguetes. Menos mal que era um assunto de amor, não de guerra.
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Homenagem a Herivelto Martins na Radio Nacional


O "Alguém muito especial" do próximo sábado, 27/02, vai relembrar alguns
dos sucessos do compositor Herivelto Martins. A homenagem vai ao ar às
9h10 da manhã, no Programa "Onde canta o Sabiá", apresentado por Gerdal
dos Santos, na Rádio Nacional do Rio de Janeiro.
Quem mora no Rio de Janeiro, é só sintonizar 1130 AM.
Quem não mora no Rio pode ouvir a rádio pela Internet:
http://www.ebc.com.br/canais/radios/radio-nacional-am-rio-de-janeiro
É só clicar em "Ao vivo".
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InfoUnB: SELEÇÃO SIMPLIFICADA PARA PROFESSOR SUBSTITUTO

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010


ÁREA: História Contemporânea

REQUISITOS:
Título de Mestre;
Regime de Trabalho: 40 horas;
Currículo comprovado e Diploma de Mestre.

INSCRIÇÃO:
1 a 5 de março de 2010

PROVA ESCRITA:
9 de março de 2010, às 14 horas

ENTREVISTA:
10 de março de 2010, às 10 horas

LOCAL:
Sala de Reuniões do Departamento de História

CONTATO:
· 3307.2366 / 3307.2787
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CALL FOR PAPERS - Portuguese Studies Review - vol. 18, n. 2, dec. 2010 (Qualis A1 - História - Capes)


Portuguese Studies Review
http://www.trentu.ca/admin/publications/psr/
http://www.maproom44.com/psr
vol. 18, n. 2, dec. 2010

Trent University ‐ Peterborough ‐ Ontario ‐ Canada

CALL FOR PAPERS

ICONOGRAPHY AND HISTORY: CRAFTSMEN, TRADESMEN, ARTISTS AND BRAZIL
(17th TO 19th CENTURIES)


Guest Editor : Prof. Dr. Carla Mary S. Oliveira, PhD
Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, Brazil
contacts: cms‐
oliveira@uol.com.br or carlamary_oliveira@hotmail.com

Relations between Art and History are not a new issue. Indeed, in recent decades, there has been a significant increase of researches that consider iconography as a privileged historical source, especially in the field of Cultural History. In Brazil, countless researchers have devoted themselves to wade through specificities of local artistic production, made by Brazilian or by foreigners traveling through the country ‐ or even by artists who have never been under the tropical sun – analyzing them by stylistic and aesthetics bias, and considering the socio‐cultural and economic conditions of their producers or even of the reception of these works of art.

The objective of this thematic issue of Portuguese Studies Review (vol. 18, n. 2, 2010) is to advance a debate, starting from iconographic sources, of their various theoretical‐methodological implications in the fields of History of Art, Cultural History and Social History, with special focus on XVII‐XIX centuries in Brazil, a period in which the social condition of the producers of art was resignified, as well as the training of these professionals was increased and a market for their production was developing. Moreover, Brazil, which came out of the condition of overseas Portugal colony, was risen to be headquarters of the Portuguese crown, and then conquered independence, becoming the only monarchy of the Americas.

The initial nucleus of this thematic issue is composed by 7 pre‐selected papers, with diversified approaches to the general theme. These papers treats on the Dutch Gold Era and the construction of a certain image of the New World through the kunstkammers, taking as example a painting of Jan Van Kessel; the circuit of public art production in 18th century Rio de Janeiro; the images produced by Carlo Julião about daily life in 18th century MinasGerais; the Portuguese tiles of Carmelite Church in colonial Paraíba and the Carmelite historical culture; the History painting in Brazil and Latin America during the 19th century; some aspects of the French artist Jean‐Baptiste Debret production in his Brazilian sojourn; and finally, the "salons" done by the Imperial Academy of Fine Arts in the 1870's as a public strategy of construction of a certain national identity in 19th century Brazil. We hope that other researches can join us in this issue of Portuguese Studies Review.

The PSR publishes articles in English, Portuguese, Spanish, and French. The final deadline for complete proposals is 30 April 2010 (please e‐mail the Guest Editor, Prof. Dr. Carla Mary S. Oliveira, for possible extension of deadline, if necessary). The initial proposals should be no longer than 300‐500 words and outline the theme, source base, and main contribution of the paper to the subject of v. 18, n. 2 issue of PSR, that will be published in December 2010.

The completed papers should be 6,000‐15,000 words long (documentation included) and should follow the PSR house style. The PSR "Instructions to Authors" are available in full at
http://www.trentu.ca/psr/author.html and http://www.trentu.ca/psr/ins_aut.html. The PSR is a refereed journal and follows a double‐blind review process. The completed articles should reach the Guest Editor before 30 April 2010. The review process will be expedited as much as possible. The authors will have approximately two weeks to revise their papers in response to the referees' comments.



PRE‐SELECTED PAPERS:

"Paraíba en Brasil": uma visita ao "Gabinete de Curiosidades" de Jan Van Kessel

"Paraíba en Brasil": a visit to Jan Van Kessel's kunstkammer
Profª Dra. Thereza Baumann, PhD
Museu Nacional ‐ Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil

Arte pública no Rio de Janeiro do século XVIII: atos de imagem entre o deleite e a razão, ou a utilidade inda que brincando
Public art in 18th Century Rio de Janeiro: image acts between pleasure and reason, or utility even that joking
Prof. Dr. José Maurício Saldanha Alvarez, PhD
Universidade Federal Fluminense, Niterói, Brazil

Imagens das Minas Setecentistas: Carlo Julião, os anônimos e iconografia comparável
18th Century Minas' images: Carlo Julião, the anonymous and comparable iconography
Prof. Dr. Eduardo França Paiva, PhD
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brazil

O Verbo mais que perfeito: cultura histórica e azulejaria portuguesa setecentista no Convento de Nossa Senhora do Carmo da
Paraíba
The 'more than perfect' speech: historic culture and 18th century Portuguese tiles in Our Lady of Mount Carmel Convent in Paraíba
Prof. André Cabral Honor, MsC, Doctorate Student
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brazil

Lazer e leitura nas imagens de Debret: o cotidiano do Brasil oitocentista pelo olhar de um neoclássico
Leisure and reading on Debret's images: the 19th century Brazilian daily life by a neoclassic view
Profª Dra. Carla Mary S. Oliveira, PhD
Profª Dra. Cláudia Engler Cury, PhD
Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, Brazil

A pintura de história no Brasil e na América Latina: convergências e rupturas
History painting in Brazil and Latin America: convergences and ruptures
Profª Dra. Maraliz de Castro Vieira Christo, PhD
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, Brazil

As Exposições Gerais da Academia Imperial: espaços lúdicos e instâncias de consagração
The Imperial Academy of Fine Arts 'Salons': playful spaces and consecration instances
Profª Isis Pimentel de Castro, MsC, Doctorate Student
Universidade de São Paulo, São Paulo, Brazil


ICONOGRAFIA E HISTÓRIA: ARTESÃOS, ARTÍFICES, ARTISTAS E O BRASIL
(SÉCULOS XVII A XIX)

As relações entre Arte e História não são novas. Na verdade, nas últimas décadas tem havido um aumento significativo das pesquisas que consideram a iconografia como uma fonte histórica privilegiada, especialmente no campo da História Cultural. No Brasil, inúmeros estudos têm se dedicado a esquadrinhar especificidades da produção artística local, seja aquela feita por brasileiros ou por estrangeiros de passagem pelo país ‐ ou mesmo porartistas que nunca estiveram sob o sol tropical ‐ tanto pelo viés da análise estilística, estética, das condições sócio‐culturais e econômicas de seus produtores ou mesmo da recepção destas obras de arte.

O objetivo deste número temático (vol. 18, n. 2, dez. 2010) da Portuguese Studies Review é possibilitar a discussão, a partir do uso de fontes iconográficas, das várias implicações teórico‐metodológicas nas searas da História da Arte, da História Cultural e da História Social, com foco especial no Brasil ‐ seja como tema ou como local de produção ‐ durante os séculos XVII, XVIII e XIX, período em que tanto a condição social dos produtores de arte se ressignificava ‐ na Europa e nas Américas ‐ como também a formação desses profissionais e o mercado que absorvia sua produção, além do próprio Brasil, que saiu da condição de colônia ultramarina de Portugal, ascendeu à de sede da coroa lusa para, logo em seguida, tornar‐se independente e, também, a única monarquia das Américas.

Os sete trabalhos já reunidos para o núcleo inicial deste número temático abordam um leque diversificado de temas dentro do recorte proposto à PSR, que vão do século de ouro holandês e da construção de um imaginário peculiar sobre o Novo Mundo nas kunstkammer que então surgiam, tomando como exemplo uma pintura de Jan Van Kessel; mostram o circuito de produção da arte pública do Rio de Janeiro de fins do século XVIII; discutem asimagens das Minas do setecentos produzidas por Carlos Julião; passam pela azulejaria portuguesa da igreja do Convento Carmelita da Paraíba colonial; discutem questões relativas à pintura de História no Brasil e na América Latina; analisam aspectos da produção artística do francês Jean‐Baptiste Debret em sua estadia no Rio de Janeiro, com foco especial sobre o modo como ele apresentava o lazer e a leitura na vida cotidiana carioca; e, por fim,debatem as exposições da Academia Imperial de Belas Artes na década de 1870 como estratégias de construção de uma certa identidade nacional no Brasil oitocentista.

Esperamos que outros pesquisadores possam se juntar a este número temático de Portuguese Studies Review. A PSR publica artigos redigidos em inglês, português, espanhol, ou francês. O prazo final para envio de propostas é 30 de abril de 2010 (por favor contatar a editora convidada, Profa. Dra. Carla Mary S. Oliveira, para a possível extensão desse prazo, se necessário). As propostas iniciais devem ter não mais do que entre 300 e 500 palavras eapresentar o assunto do artigo, suas fontes e também sua contribuição principal ao tema do v. 18, n. 2 de PSR, que será publicado em dezembro de 2010. Os artigos completos devem ter entre 6.000 e 15.000 palavras de extensão (documentação incluída) e devem seguir as normas de formatação do periódico. As "Instruções aos Autores" estão disponíveis para consulta em
http://www.trentu.ca/psr/author.html e em http://www.trentu.ca/psr/ins_aut.html. PSR é um periódico indexado, avaliado como Qualis A1 pela Capes (órgão de fomento à pesquisa do Ministério da Educação brasileiro) na área de História e segue um processo de double‐blind review. Os artigos completos devem ser enviados diretamente à editora convidada até o dia 30 de abril de 2010. O processo de avaliação das propostas será tão breve quanto for possível. Após a aprovação dos artigos, os autores terão aproximadamente duas semanas para revisá‐los, caso haja algum tipo de indicação para tanto por parte dos pareceristas.
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quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010


Indicação para pesquisa:
 
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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010













 
 










 










 
 



























































































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