Ciência // O Homem de 11 mil anos
Descoberto há quase três décadas, um dos mais antigos fósseis humanos do país está enterrado em uma gruta de Sete Lagoas (MG). Projeto prevê o resgate do achado arqueológico
Renato Alves
renatoalvez.mg@dabr.com.br
Belo Horizonte - O interior de Minas Gerais guarda um tesouro arqueológico inexplorado. Trata-se de um fóssil humano, provavelmente com 11 mil anos.
Ele está enterrado a 2 metros da superfície, próximo à Gruta Rei do Mato, em Sete Lagoas, a 600km de Brasília. Um dos mais antigos e raros exemplares dos primeiros habitantes do país agora tem chance de ser resgatado por meio da criação de um roteiro turístico que inclui os sítios arqueológicos próximos a Belo Horizonte. O projeto deve sair do papel neste ano e inclui escavações em território setelagoano, onde há ainda ossadas de animais pré-históricos.
Em importância arqueológica, o fóssil de Sete Lagoas é comparável a Luzia, o crânio de 11,5 mil anos, o mais antigo das Américas, encontrado em 1975. O crânio é um achado da missão arqueológica franco-brasileira chefiada pela francesa Annette Laming-Emperaire (1917-1977). Ele estava a 60km de Sete Lagoas, em uma gruta de Lagoa Santa, nos arredores da capital mineira. O crânio levantou dúvidas sobre a Teoria de Clóvis, pois pertence a uma mulher com características polinésias e negroides, indicando que deve ter havido alguma forma de povoamento vindo do Pacífico Sul ou da África.
Perto do aeroporto de Confins, a Lapa Vermelha, onde os arqueólogos encontraram Luzia há quase 35 anos, ficou famosa mundialmente pelos trabalhos do naturalista dinamarquês Peter Lund (1801-1880). Lá, ele descobriu, entre 1835 e 1845, milhares de fósseis de animais extintos, além de 31 crânios humanos em estado fóssil. "O fóssil de Sete Lagoas deve ter de 10 mil a 11 mil anos, a mesma idade de Luzia ou desses crânios encontrados por Lund", explica Cástor Cartelle, professor e curador de paleontologia do Museu de Ciências Naturais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG).
Cartelle fez parte do grupo de cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que, por meio de sondagens, descobriu o fóssil humano em Sete Lagoas no início da década de 1990. A equipe era chefiada pelo arqueólogo André Prous, que 20 anos antes havia participado da descoberta de Luzia. "Na Grutinha ( a menos de 50m da entrada da Gruta Rei do Mato) de Sete Lagoas, identificamos um sepultamento, um enterramento humano. Mas nunca tivemos oportunidade de escavá-lo, por falta de recursos financeiros e de tempo", conta Cartelle, hoje com 71 anos.
Pinturas rupestres - Na mesma expedição em que identificaram o fóssil, os pesquisadores da UFMG encontraram pinturas rupestres na Grutinha. "Essas pinturas são como mensagens diretas vindas daqueles primitivos habitantes que chegaram até nós", explica Cartelle. As interpretações que delas se fizeram eram as mais variadas: sinais descritivos, símbolos, batalhas, magia lugares de pouso ou sepultamento. Enfim, registros dos primeiros habitantes da região.
Entusiasmados com a importância arqueológica dos achados, Cartelle e André Prous, na época, propuseram à Prefeitura de Sete Lagoas a criação de um museu de Ciências Naturais na cidade. No entanto, os políticos locais ignoraram o projeto. Vinte anos depois, os pesquisadores apostam em um projeto do governo mineiro para resgatar o fóssil de Sete Lagoas e preservar outros sítios arqueológicos do estado. A criação de espaços com as obras descobertas em escavações será um dos atrativos da Linha Lund, um dos roteiros do Circuito Turístico das Grutas de Minas Gerais.
Turismo e ciência - A Linha Lund, que integra o projeto Conservação do Cerrado e Recuperação da Mata Atlântica do governo de Minas, busca proporcionar uma viagem ao conhecimento científico. Com 120km de extensão, a linha terá seu marco inicial no Museu de Ciências Naturais da PUC-MG, passando pelo Parque Estadual do Sumidouro, pelas grutas da Lapinha (Lagoa Santa) e Rei do Mato, e a chegada na Gruta de Maquiné (Cordisburgo).
Nesse percurso, o visitante terá a oportunidade de conhecer e se aprofundar sobre a importância científico-cultural da região de Lagoa Santa, rica em biodiversidade, em arqueologia, paleontologia e espeleologia. Com investimentos previstos de R$10 milhões, a Linha Lund deve ser implantada até o fim do ano que vem, com os receptivos turísticos das Grutas da Lapinha Rei do Mato e Maquiné e o Museu dos Primeiros Americanos no Parque Estadual
do Sumidouro.
Ocupação da América
A Teoria de Clóvis é a mais aceita pelos cientistas para explicar a ocupação da América. A ideia central da teoria é que os primeiros americanos, vindos
da Sibéria, tenham atravessado o Estreito de Bering e chegado ao Alasca há cerca de 11,5 mil anos. A travessia foi possível pois a Terra sofria efeitos
da Última Glaciação e o rebaixamento dos oceanos criou um caminho entre a Europa e a América.
Gruta Rei do Mato e Grutinha
Diferentemente do fóssil humano, as pinturas rupestres da Grutinha podem ser vistas por qualquer um. Basta parar o carro ou descer do ônibus na BR-040 (Brasília-Rio de Janeiro), em frente ao trevo de acesso a Sete Lagoas, onde fica a entrada da Gruta Rio do Mato, aberta diariamente, das 8h às 17h, com ingresso a R$ 10. O acesso à Grutinha é gratuito. Telefone: (31) 3773-0888.
Museu de Ciências Naturais
Av. D. José Gaspar, 290, Coração Eucarístico, Campus PUC-MG, Belo Horizonte (MG). Aberto às terças, quartas e sextas-feiras, das 8h30 às 17h; às quintas-feiras, das 13h às 21h; e aos sábados e feriados, das 9h às 17h. Ingresso a R$4. Encontros com educadores duram duas horas e ocorrem em duas segundas-feiras por mês, às 10h e às 14h. A atividade é gratuita e deve ser agendada pelo telefone (31) 3319-4520.
Descoberto há quase três décadas, um dos mais antigos fósseis humanos do país está enterrado em uma gruta de Sete Lagoas (MG). Projeto prevê o resgate do achado arqueológico
Renato Alves
renatoalvez.mg@dabr.com.br
Belo Horizonte - O interior de Minas Gerais guarda um tesouro arqueológico inexplorado. Trata-se de um fóssil humano, provavelmente com 11 mil anos.
Ele está enterrado a 2 metros da superfície, próximo à Gruta Rei do Mato, em Sete Lagoas, a 600km de Brasília. Um dos mais antigos e raros exemplares dos primeiros habitantes do país agora tem chance de ser resgatado por meio da criação de um roteiro turístico que inclui os sítios arqueológicos próximos a Belo Horizonte. O projeto deve sair do papel neste ano e inclui escavações em território setelagoano, onde há ainda ossadas de animais pré-históricos.
Em importância arqueológica, o fóssil de Sete Lagoas é comparável a Luzia, o crânio de 11,5 mil anos, o mais antigo das Américas, encontrado em 1975. O crânio é um achado da missão arqueológica franco-brasileira chefiada pela francesa Annette Laming-Emperaire (1917-1977). Ele estava a 60km de Sete Lagoas, em uma gruta de Lagoa Santa, nos arredores da capital mineira. O crânio levantou dúvidas sobre a Teoria de Clóvis, pois pertence a uma mulher com características polinésias e negroides, indicando que deve ter havido alguma forma de povoamento vindo do Pacífico Sul ou da África.
Perto do aeroporto de Confins, a Lapa Vermelha, onde os arqueólogos encontraram Luzia há quase 35 anos, ficou famosa mundialmente pelos trabalhos do naturalista dinamarquês Peter Lund (1801-1880). Lá, ele descobriu, entre 1835 e 1845, milhares de fósseis de animais extintos, além de 31 crânios humanos em estado fóssil. "O fóssil de Sete Lagoas deve ter de 10 mil a 11 mil anos, a mesma idade de Luzia ou desses crânios encontrados por Lund", explica Cástor Cartelle, professor e curador de paleontologia do Museu de Ciências Naturais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG).
Cartelle fez parte do grupo de cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que, por meio de sondagens, descobriu o fóssil humano em Sete Lagoas no início da década de 1990. A equipe era chefiada pelo arqueólogo André Prous, que 20 anos antes havia participado da descoberta de Luzia. "Na Grutinha ( a menos de 50m da entrada da Gruta Rei do Mato) de Sete Lagoas, identificamos um sepultamento, um enterramento humano. Mas nunca tivemos oportunidade de escavá-lo, por falta de recursos financeiros e de tempo", conta Cartelle, hoje com 71 anos.
Pinturas rupestres - Na mesma expedição em que identificaram o fóssil, os pesquisadores da UFMG encontraram pinturas rupestres na Grutinha. "Essas pinturas são como mensagens diretas vindas daqueles primitivos habitantes que chegaram até nós", explica Cartelle. As interpretações que delas se fizeram eram as mais variadas: sinais descritivos, símbolos, batalhas, magia lugares de pouso ou sepultamento. Enfim, registros dos primeiros habitantes da região.
Entusiasmados com a importância arqueológica dos achados, Cartelle e André Prous, na época, propuseram à Prefeitura de Sete Lagoas a criação de um museu de Ciências Naturais na cidade. No entanto, os políticos locais ignoraram o projeto. Vinte anos depois, os pesquisadores apostam em um projeto do governo mineiro para resgatar o fóssil de Sete Lagoas e preservar outros sítios arqueológicos do estado. A criação de espaços com as obras descobertas em escavações será um dos atrativos da Linha Lund, um dos roteiros do Circuito Turístico das Grutas de Minas Gerais.
Turismo e ciência - A Linha Lund, que integra o projeto Conservação do Cerrado e Recuperação da Mata Atlântica do governo de Minas, busca proporcionar uma viagem ao conhecimento científico. Com 120km de extensão, a linha terá seu marco inicial no Museu de Ciências Naturais da PUC-MG, passando pelo Parque Estadual do Sumidouro, pelas grutas da Lapinha (Lagoa Santa) e Rei do Mato, e a chegada na Gruta de Maquiné (Cordisburgo).
Nesse percurso, o visitante terá a oportunidade de conhecer e se aprofundar sobre a importância científico-cultural da região de Lagoa Santa, rica em biodiversidade, em arqueologia, paleontologia e espeleologia. Com investimentos previstos de R$10 milhões, a Linha Lund deve ser implantada até o fim do ano que vem, com os receptivos turísticos das Grutas da Lapinha Rei do Mato e Maquiné e o Museu dos Primeiros Americanos no Parque Estadual
do Sumidouro.
Ocupação da América
A Teoria de Clóvis é a mais aceita pelos cientistas para explicar a ocupação da América. A ideia central da teoria é que os primeiros americanos, vindos
da Sibéria, tenham atravessado o Estreito de Bering e chegado ao Alasca há cerca de 11,5 mil anos. A travessia foi possível pois a Terra sofria efeitos
da Última Glaciação e o rebaixamento dos oceanos criou um caminho entre a Europa e a América.
Gruta Rei do Mato e Grutinha
Diferentemente do fóssil humano, as pinturas rupestres da Grutinha podem ser vistas por qualquer um. Basta parar o carro ou descer do ônibus na BR-040 (Brasília-Rio de Janeiro), em frente ao trevo de acesso a Sete Lagoas, onde fica a entrada da Gruta Rio do Mato, aberta diariamente, das 8h às 17h, com ingresso a R$ 10. O acesso à Grutinha é gratuito. Telefone: (31) 3773-0888.
Museu de Ciências Naturais
Av. D. José Gaspar, 290, Coração Eucarístico, Campus PUC-MG, Belo Horizonte (MG). Aberto às terças, quartas e sextas-feiras, das 8h30 às 17h; às quintas-feiras, das 13h às 21h; e aos sábados e feriados, das 9h às 17h. Ingresso a R$4. Encontros com educadores duram duas horas e ocorrem em duas segundas-feiras por mês, às 10h e às 14h. A atividade é gratuita e deve ser agendada pelo telefone (31) 3319-4520.
Comente
Sua mensagem será avaliada e logo depois liberada.