Novo encantamento sobre a história

quarta-feira, 20 de outubro de 2010


 
Novo encantamento sobre a história
Linhares: pela "potência crítica"
Fonte: GAZETA DO SUL Cristina Severgnini
cristina@gazetadosul.com.br
 
Vivemos um período de encantamento pela história. Filmes, programas de televisão, documentários e revistas especializadas estão à disposição de um público cada vez mais amplo e ávido pelo conhecimento do passado. Um exemplo recente foi o lançamento do livro 1822, de Laurentino Gomes, que chegou às livrarias em setembro e alcançou mais de 200 mil exemplares vendidos antes do término da primeira semana. A vendagem é considerada fenomenal para livros de não ficção e continua aumentando.

O fato mais positivo da produção midiática e literária sobre a história é que muito mais pessoas estão tomando conhecimento de acontecimentos e personagens históricos, importantes para entender a atualidade. E o melhor de tudo é que isso ocorre com prazer, pois é difícil parar de ler textos atraentes, bem construídos e realmente agradáveis como os apresentados nos livros 1822 e o anteriormente lançado 1808, ambos de Laurentino Gomes.

Porém, esses novos tempos, reconhecidamente interessantes para a história, onde se tem acesso fácil a diversos produtos culturais, é visto com cautela por especialistas no assunto. O professor-doutor em História, Mozart Linhares da Silva, lembra que o fato de haver um novo encantamento pelo assunto é bom. Mas alerta que é preciso ter o cuidado de não tornar o conhecimento histórico apenas uma mercadoria, um bem de consumo que perca sua potência crítica. "O problema é saber reconhecer a qualidade do que se consome", diz.

Linhares explica que o sucesso que fazem esses livros direcionados ao público amplo é um ótimo exemplo de como a história vive um período de grande interesse social. "Mas é preciso considerar que esses livros, sobretudo quando produzidos por diletantes, nem sempre trazem conhecimento relevante ou atual sobre determinado tema", salienta. "Em alguns casos se evidencia mais um processo de sedução do leitor a partir de uma história bem escrita, recheada de curiosidades, mas infelizmente pouco fundamentada e com metodologia duvidosa."

Ao comentar sobre os livros 1822 e 1808, ele diz que são obras bem escritas, mas que não trazem nada que não se conheça desde sempre na historiografia. "Apresentam-se como grandes novidades, mas na realidade são escritos para um público muito amplo e pouco especializado." Segundo Linhares, servem como um bom estímulo de leitura, mas não como exemplo de uma reflexão profunda sobre a história. "Outro problema é que, para seduzir leitores, se subtrai toda a reflexão teórica e a metodologia e, o que é pior, procura-se focar em curiosidades e histórias de personagens", salienta. "Trata-se de uma história conservadora e passadista, mas com texto bem escrito, '1822' é um bom livro para quem realmente nunca se aproximou da história da independência. No entanto, para um leitor mais treinado, não acrescenta muito. Não leva à reflexão, dá o sonho sonhado."

Curso é um bom caminho

O historiador explica ainda que é importante entender que assim como há a história política, social, econômica e cultural, existe a história da ciência, dos saberes, da Medicina, do direito das mentalidades, do cotidiano e até do meio ambiente. "Estudar esse assunto não é se apropriar da trajetória de uma área do conhecimento. O que se impõe ao estudioso profissional é a capacidade de problematizar e construir essa história", explica. "Ela está sempre em movimento e requer métodos e teorias atualizadas." Lembra que o curso de História é um bom caminho para quem pretende entender dessa área que é, ao mesmo tempo, ampla e especializada. "Tenho orgulho de ensinar na Unisc (Universidade de Santa Cruz do Sul), que tem um curso muito bem avaliado pelo MEC, com egressos que estão colaborando para a atualização daquilo que as escolas precisam ensinar."
 
FONTE: GRUPO DE ESTUDOS DA HISTORIA DO BRASIL