Entenda o novo processo de formação proposto pelo Tratado de Bolonha

sábado, 11 de outubro de 2008


O Tratado de Bolonha começa a ser muito comentado também aqui no Brasil, mas muito tem se especulado e por isso estou fazendo uma pesquisa para passar para meus leitores o que muda a partir da implantação deste tratado.

O que muda no sistema europeu?
Entenda o novo processo de formação proposto pelo Tratado de Bolonha
Publicado em 11/08/2006 - 00:01

Quando se estabeleceu o Tratado de Bolonha, foram definidas linhas gerais da atuação do Espaço Europeu de Ensino Superior, como a promoção da mobilidade e intensificação da cooperação entre as instituições. Para alcançar essas diretrizes, a decisão tomada foi pela criação de um sistema único, que eqüalize a formação entre os países signatários do acordo ao mesmo tempo em que permite que o estudante se desloque de uma instituição a outra, aproveitando os créditos já acumulados.

Além disso, foi trabalhada uma proposta que tornasse o sistema atrativo para os jovens, fazendo com que esses apostem na formação de nível superior. "Alguns aspectos propostos são positivos, como fazer os currículos mais condensados. Isso faz com que haja agilidade, mas a formação se encaixa mais nas necessidades de profissionalizar rapidamente para enviar ao mercado", explica o professor do departamento de Educação da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), José Dias Sobrinho, autor do livro "Dilemas da Educação Superior no mundo globalizado. Sociedade do conhecimento ou Economia do conhecimento?".

Entenda abaixo as duas alterações polêmicas propostas no processo de Bolonha:

Validação dos créditos e mobilidade

Um dos pontos focais da Declaração de Bolonha é a questão da mobilidade estudantil. Permitir que os alunos circulem por todo o sistema segue uma tendência já presente na constituição da União Européia, expandindo as fronteiras e criando estados transnacionais. Desta forma, os currículos seriam unificados (no formato que será explicado a seguir) e os créditos validados em qualquer instituição dos países que optarem por integrar o Espaço Europeu de Ensino Superior.

"A Europa precisava desenvolver a questão da unidade de uma forma que proporcionasse coesão no sistema, com reconhecimento de umas universidades para as outras. Isso resulta em dois fatores principais - mobilidade e empregabilidade", explica a professora Luciane Stallivieri, presidente da Faubai (Fórum de Assessorias das Universidades Brasileiras para Assuntos Internacionais). "Com essa mobilidade, o estudante pode desenvolver parte dos estudos em Portugal, seguir para a Espanha em um segundo momento e, depois, concluir na França."

Parece simples, mas não é. A Europa é historicamente marcada por sua diversidade cultural. Países próximos fisicamente e distantes cultural e ideologicamente. Como garantir que uma escola alemã aceitará qualquer estudante francês para cursar seus créditos? Ou mesmo que o mercado de trabalho português dará espaço a um advogado romeno, sueco ou islandês.

"Na Europa eles vão ter problemas sérios com isso. Basta ver as guerras daqueles países que estão se fragmentando. Acredito que a diversidade cultural é uma questão muito mais forte do que aqui", aponta Dias Sobrinho. "Às vezes, mesmo dentro de um país. Na Espanha, por exemplo, são várias regiões que entram em disputa. E agora ainda há estes novos países menos desenvolvidos que estão entrando na União Européia e têm problemas sérios neste sentido."

Para o presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), Jorge Guimarães, o problema vai além. Segundo ele, é impossível equalizar todas as instituições de um dia para o outro, simplesmente porque elas possuem níveis distintos. "Um dos grandes problemas do processo de Bolonha é não ter um sistema de avaliação. Se não cuidarem desse aspecto, dá a entender que todas as universidades estão no mesmo patamar, o que não é verdade. Temos discutido muito isso com nossos pares europeus. Para dar um passo desses é preciso instituir um processo rigoroso de avaliação", afirma.

Sistema 3+2+3

A modificação que é, talvez, a mais importante da Declaração de Bolonha se dá na unificação dos ciclos para as carreiras superiores. A partir da implantação definitiva do tratado, a organização passará a operar no formato 3+2+3, ou seja, três anos de graduação, dois de mestrado e outros três de doutorado. Os ciclos também podem ter sua duração ajustada em alguns casos para o formato 4+1 (quatro anos de graduação e um de mestrado). Uma vez implantado, o sistema reduziria sensivelmente o tempo total da formação - hoje girando em torno de doze ou treze anos. Seriam três ciclos, organizados da seguinte forma:

1º Ciclo (equivalente ao Bacharelado ou Licenciatura no Brasil) - grau acadêmico conferido após os três primeiros anos de freqüência com aproveitamento equivalente a 240 ECTS (Créditos Estudantis do Sistema Europeu, na sigla em inglês);


2º Ciclo (equivalente ao Mestrado no Brasil) - grau acadêmico concedido após dois anos de freqüência, obrigatoriamente ligado ao 1º Ciclo, culminando com a organização e apresentação de uma tese dissertação - equivalente a 120 ECTS;


3º Ciclo (equivalente ao Doutorado no Brasil) - título acadêmico de maior prestígio, conferido normalmente após três anos, culminando com a organização e apresentação de uma tese.

Compreender o impacto desta formatação é de suma importância, pois ela incompatibiliza o sistema europeu com quase todos os demais - a começar pelo brasileiro. "Formar um graduado em três anos me parece, em muitas áreas, um contra-senso. Em conseqüência disso, porque esses três anos serão o novo patamar para graduação, eles vão tornar obrigatório o mestrado. Senão a formação ficará muito frágil. Então, incorporam-se os dois e, com isso, melhora um pouco o formato graduação + mestrado", diz Guimarães.

Uma prova de que o formato está longe de ser uma unanimidade, mesmo na União Européia, é o fato de que algumas carreiras sequer cogitam adotar esse modelo. É o caso da Medicina, por exemplo. "Em algumas áreas profissionais, esse modelo não vai ser aplicado e nem é aplicável. Ele também tem as suas limitações e elas estão sendo consideradas", explica o presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior", Paulo Speller, que também é reitor da UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso). "Para mim, esta unificação é uma padronização por baixo, visando uma formação não perene na graduação."

Fonte: Universia